STF. Ensino religioso nas escolas públicas - 2




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DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO – SERVIÇOS

Ensino religioso nas escolas públicas - 2

O plenário retomou o julgamento de ação direta na qual se discute o ensino religioso nas escolas públicas do país (Informativo 875).

O ministro Gilmar Mendes acompanhou a divergência e votou pela improcedência do pedido formulado na ação para conferir interpretação conforme à CF do art. 33, “caput”, e §§ 1º e 2º (1), da Lei 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB), e do art. 11, § 1º (2), do acordo Brasil-Santa Sé aprovado por meio do Decreto Legislativo 698/2009 e promulgado por meio do Decreto 7.107/2010.

Pontuou que neutralidade estatal não é o mesmo que indiferença. Afirmou que, ainda que o Estado seja laico, a religião foi e continua sendo importante para a formação da sociedade brasileira.

Asseverou que a proposta de ensino não confessional retira o sentido da norma constitucional. Nesse contexto, o ensino religioso passa a ser filosofia e sociologia das religiões e deixa de representar o ensino religioso tal como está no texto constitucional.

O ministro Dias Toffoli também acompanhou a divergência. Afirmou que a separação entre o Estado brasileiro e a Igreja não é uma separação absoluta. Apontou que a neutralidade diante das religiões que a laicidade estatal impõe encontra ressalvas em razão de preceitos constantes na própria Constituição Federal [CF, arts. 5, VI, VII e VIII (3), art. 19, I (4), 150, VI, “b” (5), 210, §1º (6) e 213(7)].

Asseverou que o modelo de laicidade adotado no Brasil compreende uma abstenção do Estado, pois impede que o poder público favoreça corporações religiosas, prejudique indivíduos em razão de suas convicções ou impeça a liberdade de expressão religiosa. Entretanto, abrange também, por expressa previsão constitucional, condutas positivas do poder público para assegurar a liberdade religiosa. Nesse contexto, afirmou que a previsão de ensino religioso nas escolas públicas configura uma atuação positiva do Estado e demonstra a relevância que a CF conferiu à educação e ao ensino religioso na formação do indivíduo.

Em seguida, pontuou que o art. 210, §1º, da CF, ao prever a oferta do ensino religioso na modalidade facultativa, resguarda, de um lado, o desejo dos que querem se aprofundar em determinada fé, e de outro, o desejo dos que não querem se sujeitar a determinados dogmas e preceitos. Por essa razão, a procedência da presente ação direta acarretaria verdadeira mutação constitucional do sentido da norma, sem os pressupostos que embasam o processo de alteração informal do texto constitucional.

Entendeu que a solução para garantir o legítimo direito constitucional de quem não adota crença ou de quem professa religiões minoritárias não pode acarretar a exclusão dos que adotam crenças dominantes do âmbito de proteção da norma. Explicou que, quando se está diante de uma proteção constitucional ou legal deficiente, seja por um defeito na sua redação ou por uma falha em sua aplicação, a solução consentânea com o princípio da dignidade da pessoa humana não se dá pela exclusão dos protegidos, mas pela inclusão dos excluídos.

Assim, concluiu que o ensino religioso confessional pode ser praticado de forma plural dentro das escolas públicas. Para tanto, a sociedade civil deve ser chamada para definir quais os credos que devem ser ofertados, respeitando-se, sempre, a facultatividade da matrícula.

O ministro Ricardo Lewandowski também votou pela improcedência do pedido. Afirmou que a Constituição brasileira conta com parâmetros precisos para garantir o direito integral dos alunos de escolas públicas em relação ao ensino religioso, seja ele confessional ou interconfessional. Pontuou que a facultatividade desse tipo de ensino é salvaguarda suficiente para o respeito ao pluralismo democrático e à liberdade de crença dos alunos e de seus pais.

Explicou que o conceito de laicidade se embasa nos critérios de tolerância, igualdade e liberdade religiosa. Por fim, salientou que esse princípio constitucional é voltado à proteção das minorias que, graças à separação entre Estado e Igreja, não podem ser obrigadas a se submeter aos preceitos da religião majoritária.

Em seguida, o julgamento foi suspenso.

(1) LDB: “Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso”.
(2) Acordo Brasil-Santa Sé: “Art. 11. A República Federativa do Brasil, em observância ao direito de liberdade religiosa, da diversidade cultural e da pluralidade confessional do País, respeita a importância do ensino religioso em vista da formação integral da pessoa. §1º. O ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma de discriminação”.
(3) CF: “Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva; VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;”.
(4) CF: “Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público”.
(5) CF: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios VI - instituir impostos sobre: (...) b) templos de qualquer culto”.
(6) CF: “Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais. § 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental”.
(7) CF: “Art. 213. Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que: I - comprovem finalidade não-lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação; II - assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades”.
ADI 4439/DF, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 21.9.2017. (ADI 4439)

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